Tudo aquilo que se exprime não vale apenas pelo conteúdo que significa, mas pela própria expressão em si. Quando achares que não tens nada a dizer, fala.
Fala e vais-te surpreender como ao dares o passo de te abrires à expressão, começarás a criar. Palavra ocas serão preenchidas com as cores do subentendido. O teu espírito se abrirá ao mundo e aos outros, e irás descobrir novas estradas dentro de ti.
Não fales e verás como o bolor criado por palavras caladas e emoções reprimidas irá construir uma muralha à volta do teu coração. Terás a falsa impressão de que estarás seguro, não exposto à vulnerabilidade, guardando todos os teus tesouros num cofre dentro de um alçapão nos calabouços mais profundos dessa muralha. Dormirás em paz pensado que tens a chave desse cofre bem guardada num bolso junto ao peito. Mas após algum tempo sem usares esses tesouros, sem os ofereceres aos que te rodeiam, sem sentires o sabor dessa riqueza, vais começar a esquecer esse sabor. E os tesouros deixarão de ter importância. E o que importará é construir uma muralha ainda mais alta, para afastar dragões e povos instrusos. E a chave deixará de andar junto ao peito, um dia vais-te esquecer dela numa caixa em cima da mesinha de cabeceira, aí ficando na esperança desacreditada de um dia surgir um alguém por milagre que descubra a chave, desça aos calabouços, abra o alçapão, retire o cofre, encontre os tesouros e tenha a ousadia de usar os tão vangloriados, cobiçados e bem guardados tesouros.

- Não tenhas medo de ficar com o cofre vazio, porque um cofre vazio é aquele que mais está preparado para receber. É aquele que perdeu o medo de perder porque nada tem. É aquele que tudo pode ser porque nada é. Ele possui a possibilidade do infinito.
- Não tenhas medo de te expor a riscos, de te sentires vulnerável, de seres pequenino. Quando nasceste o teu cofre estava vazio, não conhecias tesouros nem conhecias o medo de perder tesouros, e por isso tudo davas e tudo recebias. Esse tudo era tão pouco e tão pequenino, mas tão valioso, como o núcleo de um diamante que nasceu da grafite de carbono.
Por isso, fala e nada guardes.
Com isto acrescento - não sejas imprudente. Tudo o que pensas, pensa-o duas vezes antes de falar. Tudo o que sentes, sente-o cerca de dez mil vezes antes de o exprimir. E não te esqueças que ao exprimi-lo irás criar mais sentimentos sobre os quais irás pensar, e mais pensamentos que irás sentir. Estás a participar na criação.
Não é por acaso que a primeira frase de uma das histórias do livro mais famoso do mundo começa com "No princípio era o Verbo. E o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus".
Criamos com esse verbo que se gera dentro de nós. Mas após amadurecida a sua gestação, ele apenas cresce quando o libertamos para fora de nós. Vamos criar e fazer nascer vida. Chega de abortos de palavras e expressões, das quais somos os únicos juízes sobre a sua vida ou morte.
15.07.2011