sábado, 3 de setembro de 2011

Há uma parte de mim

Há uma parte de mim
que está sempre disposta a partir.
É uma parte que não tem medo de não sentir, não desejar, não ter e nada ser.
Essa parte de mim é eterna e impenetrável
como um diamante.

Há uma parte de mim
indomável.
Que nunca será tua, que é apenas minha e do universo.
É a parte que me liga como um fio invisível às estrelas
como se fossem irmãs, como se eu viesse delas.
Essa parte não é de ninguém, é apenas de Deus
e do infinito.

Há uma parte de mim
que só a mim pertence
É uma parte etérea, selvagem e pura.
Que não tem nada, nem ninguém,
nenhum apego, nenhuma posse, nenhuma saudade de nada deste mundo.
Essa parte não tem medo de a qualquer momento partir
de ti, do mundo, da vida, da beleza dos seres.
Porque ela sabe que tudo é, tudo foi e tudo sempre será.

Há uma parte de mim
que não precisa de rimar.
É uma parte que não sente necessidade alguma da perfeição
que é livre, aleatória e magnética.

Essa parte é a força pura do amor em bruto
E a todo o momento busca a verdade
sem receio de descobrir algo feio, desadequado ou triste
Porque sabe que essa verdade liberta
e é unica coisa que existe
desde o princípio e do fim
dessa ilusão chamada tempo.


14.07.2011

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Quando eu for Terra...

Um dia hei-de ser terra, e os bichos hão-de comer a minha carne, que será apenas matéria dissolvida na natureza. O meu corpo será como as raízes que alimentam as árvores, e cada insecto e larva responsável pela transformação da vida irá absorver um pouco do meu "Não Ser".
E seja esta projecção grotesca ou não, o certo é que não me repugna - deveria? Ao visualizar essa certeza incontornável encontro nela um efeito de paz causado pela aceitação do fim inescapável. E que não é "fim" em si mesmo, mas uma parte do ciclo da natureza, parte na qual participamos insconscientemente.

Nessa altura, quando o meu corpo se fundir com o resto da Terra, será que existirá uma réstia de mim que vai continuar a flutuar pelo universo? Que se elevará do meu corpo, então alimento da borbulhante vida subterrânea, e se integrará com o resto da luz do universo? Essa réstia de mim chamada alma, que foi criada no "início dos tempos" a partir de um átomo de hidrogénio - como todas as outras coisas que existem - um átomo que sucessivamente se foi transformando noutros mais complexos, concretizando todo o tipo de matéria e não matéria, existente e em potencial.

E será que essa réstia de mim, ao se fundir com o Todo universal, se desintegra esfumando-se nesse todo e desaparecendo assim na sua identidade singular que um dia existiu dentro de um corpo chamado meu?
Ou será que, apesar de se submergir no Espaço, esse pedacinho de universo chamado "Eu" continua íntegro, como que aglomerado em torno de um núcleo identitário que um dia foi conhecido por "Eu"?
Quero profundamente acreditar na segunda hipótese. Pois quero que seja possível a qualquer momento apelar e aceder a esse bocadinho de "Ti" que agora está integrado novamente no universo, como um dia também estarei. Pois essa réstia de ti, que é agora Luz, me ilumina sempre que para ela olho, encontrando-a dentro da minha própria luz, que contenho ainda dentro do meu corpo.

Eu bem sei que somos todos Um, e que a aparente sensação de separação que existe entre os corpos vivos é ilusória. Esta ilusão serve para que, através da sensação de "falta" de união, sintamos a necessidade de união, e assim vivamos em busca do Amor, matéria da qual a nossa essência é feita e que por isso nos é tão familiar e desesperadamente preciosa. Da mesma forma que o ouro mais brilha quando está sobre o contraste do azul, também nós mais sentimos o desejo de Amor nestas vidas na terra com o corpo nos dando a sensação de que estamos separados uns dos outros, de que o Amor está fora de nós. Quando na verdade não está, pois nós somos Amor, assim como Deus o é, e Tudo o é.

Eu bem sei...
Mas como quem escreve estas linhas e sente estas verdades é uma pessoa dentro de um corpo que vive através dos seus sentidos, é inescapável o desejo de "Te" sentir através da vida deste corpo, corpo onde habita o pedaço de universo que também sou.
Eu sei que a alma é eterna, que não existe fim para o Ser. Acredito até que este Ser se mantém como "Tu" individual mesmo que em imersão com o resto do Todo. E acredito que posso a qualquer momento alcançar-te e sentir esse flash de Amor puro que agora és.
Mas perdoa-me a minha fraqueza de humana com o síndrome da separação, pois é falta que eu sinto de "Ti", e o meu maior desejo insatisfeito ("desejo" - outra limitação humana fruto da ilusão do não ter) é não poder nesta dimensão de tempo sentir-te crua e linearmente através das células deste corpo, que um dia há-de ser terra para que também eu me funda com a luz...e contigo.

02.09.2011
03:29

Nota de suicídio (falhada)

Gostava de ser uma árvore. Ou um lince. Ou simplesmente uma alma a flutuar no espaço. Entre as estrelas.
Não sentir dor, não sentir fome, não sentir paixão, não sentir vontade, não sentir medo, não sentir expectativa, não sentir.

Apenas Ser. Ser. Existir. Ouvir o eterno eco do Nada. De Tudo. De Deus. Do Espaço. Da Natureza. Do Infinito. De tudo o que é, foi e sempre será. De tudo o que É.

Porque apenas existe o que É. O que é Agora. O Agora é eterno. Se conseguirmos ser o agora, conseguimos ouvir o Infinito - Deus - a Alma do Mundo. Aquilo que todos somos.

Isso é o que eu gostava de Ser. Já o sou, como todas as coisas o são, mas não o Sei. Ou sei, mas não o sinto - não me sinto.

Sinto-me apenas demasiado cheia. Gostava de ser vazia. Gostava de Não Ser nada. Para poder ser apenas o Todo. Para conseguir ouvir o eco do Universo.

Mas não consigo. Há muito ruído. Muito conteúdo. Muito recheio. Que a forma se esbate. A forma, a coisa mais pura de nós, de mim, deixa de Ser. Passa a ser apenas um instrumento do mundo. Um utensílio dos homens, das coisas mentais e quotidianas.

Quero voltar à alma do mundo. Ao coração do universo. Quero ser só uma luz.

Sem nenhuma pretensão, objectivo ou afazer.



Mas quando se embarca na aventura da vida, não há volta atrás.

Porque haverá sempre um antes e um depois. Como há a.C. e d.C., mesmo para um homem tão divino como ele.

Uma pessoa, depois de nascer, não pode deixar de existir. Apenas pode morrer. O que é tão ou mais doloroso que viver.

E doloroso independentemente da alegria, felicidade, tristeza ou miséria que a vida de alguém tenha.

O único caminho que resta é Aceitar. Render-mo-nos à vida. Fazer paz connosco. Perdoar o mundo. Amar o que nos rodeia. E sentir o amor que irradia das coisas simples que ainda são verdadeiramente autênticas.

E, ocasionalmente, sentir uns flashes de lucidez. Ver a Verdade. Ouvir a Consciência de tudo. Ser livre. Livre de alma.

Simplesmente Ser.





18.01.2010 

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Preciso o que não é preciso

Eu sei que não deveria sentir nenhum tipo de carência ou frustração pela ausência da satisfação das minhas necessidades emocionais. Eu sei que, após tanto crescimento espiritual, emocional e cognitivo, a consciência inteligente deveria ser a bússula da minha direcção - e não a busca irracional de um desejo subconsciente de ver satisfeitas todas as minhas exigências reais e subliminares, verbalizadas ou subentendidas, imediatas ou futuras. Como se se esta satisfação estivesse situada num pólo exterior a mim; como se a sede pudesse ser saciada através de uma fonte que jorra uma poção composta pelo produto matemático perfeito entre a imoderada dependência e o estável comprometimento.

Eu bem aprendi, por conhecimentos divulgados e inspirações de verdade assimiladas, que este sentimento de bem-estar emocional é da nossa íntima e inteira responsabilidade, tem origem em algo simultaneamente interno e transcendente, e a sua magnanimidade é mais do que tudo o que alguém nos possa dar ou algo nos possa proporcionar.

Então, se isto é o que eu sei - que a minha razão arrumou já numa das prateleiras principais da minha biblioteca cerebral, que o meu espírito corrobora através do conhecimento iluminado daquilo que sinto como sendo a verdade - porque é que as minhas acções e pensamentos imediatos são guiados pela réstia de id freudiano e indivíduo médio que existe em mim? Será esta uma necessidade irracional de dramatização e de eterna insatisfação que é fomentada pelas personagens de telenovela, enredos de filmes teen românticos e elevação mediática em talkshows de casos de vidas subvertidas? Ou será que, no fundo, nunca nos conseguiremos libertar deste lado da natureza humana, que apesar de crescer em inteligência e espírito, será sempre também uma parte animal selvagem cuja índole grita pela sobreviência e necessidade de dependência emocional como ferramentas neolíticas de defesa contra o medo último do homem - a morte?

O que é sei é que enquanto as minhas acções não acompanharem o que sei, não saberei verdadeiramente.



01.09.2011