domingo, 25 de março de 2012

Porque é que eu amo a matemática

A matemática é a prova simplificada da perfeição de tudo o que existe. Todas as perguntas do mundo e todas as leis que regem o cosmos, as pessoas, o natural e o sobrenatural podem, em última instância, ser traduzidas numa fórmula matemática - se tivermos a habilidade para o fazer (e, no presente histórico, temos já essa habilidade até certo ponto).

Este facto tão cru contém toda a poesia do mundo: toda a rima e toda a música são combinações matemáticas transformadas em linguagem de emoções; todos os passos de dança e todos os lances de bola são a tentativa do corpo se aproximar da perfeição de uma equação. Este facto tão isento de beleza contém em si toda a magnanimidade indolente do nosso arrogante universo: uma beleza que não se escarrapacha, mas que é tão obviamente límpida por detrás do véu do caos aparente.

A matemática é o lado abstracto da realidade: aquele que não se vê a olho nu, mas que se pensa - e, se virmos bem, é a pensar que se vê.

2012.03.25
23:33

sábado, 24 de março de 2012

O defeito do conhecimento


transcrito de antigo diário escrito em 13.06.2002



Chego à conclusão espontânea - como que aparição ou insight - de que o conhecimento é: não a aquisição de algo que existe e que pela sua transposição do exterior para o interior do homem se torna consciente ou simplesmente presente em nós, mas é: uma mera (louvável) criação do homem que se preocessa no seu interior , acerca daquele exterior que se transpõe para o interior voluntaria ou involuntariamente.

O conhecimento não é mais do que uma invenção que funciona como uma arma de auto-defesa para esbater a explícita inferioridade do homem no mundo e no universo. Portanto, tudo aquilo que nós sabemos garantidamente que existe nunca será realmente provado se existe tal como o apercebemos, pois as coisas só existem em nós através de nós e porque nós existimos. Assim, dada a limitação e possível defeituosidade dos nossos recursos percepcionais e cognitivos, nunca e jamais teremos a certeza da verdade pura - não deformada pelos órgãos dos sentidos particulares de cada espécie.

Pois, se uma abelha vê o mesmo favo de uma angulatura mais ovalada e avolumada que a nossa; e se um cão não vê o vermelho - então que poder temos para exercer a nossa perspectiva como a mais aceite e adequada? Seguramente poderão existir outras potencialidades sensoriais que nós não conhecemos para fazer desencadear diferentes associações de conhecimento. Porque se não tivessemos olfacto não daríamos pela sua falta e olharíamos para a capacidade identificadora do cão através de pistas olfactivas com visão de estupfacção, admiração, curiosidade e até culto.

É o que acontece com os fenómenos sobrenaturais aparentemente inexplicáveis e aos quais se atribuem causas ilógicas e desconexas - assim é porque eles envolvem, digamos, "energias" que se corelacionam desencadeando um processo do qual não temos capacidade perceptiva - e consequentemente cognitva - para assimilar e explicar - e dos quais por isso só conhecemos o produto* e não o processo**.
foto: simulação da visão de um cão



*por ex., uma jarra a mover-se e cair sem uma razão aparente
** a força/energia que leva a jarra a cair



sexta-feira, 16 de março de 2012

Receita para ser feliz

1. Ter conhecido a infelicidade.
Se nunca estiveste na escuridão, não saberás reconhecer a luz como luz; a luz será apenas uma substância sublatente a ti, à qual és indiferente.
Uma das formas de ensinar uma verdade é mostrar o seu contrário: identificamos uma verdade quando conhecemos o seu contrário (um peixe é aquilo que não anda na terra; o dia é aquilo que não é noite; a pobreza é aquilo que não tem abundância). Por isso, para conseguires abraçar a tua felicidade, reclamá-la como tua e gritá-la sem escrúpulos, tens inevitavelmente que ter antes caído num poço sem fundo. Caso contrário, poderás estar a ser feliz sem saber - e ser feliz sem saber é (a não ser que tenhas sete anos) um despredício de felicidade.

2. Amar: as pessoas; o mundo; Deus; tu; uma pessoa especial - ou quaisquer outras coisas que te inspirem amor.
Estar feliz é como estar apaixonado. Sentir felicidade é sentir amor: serás tanto mais feliz quanto mais amor sentires - e o amor é como uma luz que emites e depois se reflecte de volta para ti na forma de felicidade (não é uma troca directa de bens). A felicidade é portanto o produto da multiplicação do amor (amor x vida = felicidade).

3. Decidir ser feliz.
A felicidade é uma opção pessoal que exige coragem, porque, quando decides ser feliz, já não te poderás queixar ou culpar e infelicidade pelos teus problemas; quando decides que podes, deves e queres ser feliz, começas a viver todo tu, o tu todo, e deixas de ficar à espera que isto ou aquilo aconteça para que a tua vida comece.

4. Estar consciente da morte.
Regra geral, só estudas (ou estudas até ter que pôr palitos nas pálpebras) quando vais ter teste, certo?; e só treinas (ou treinas até pingar) quando sabes que vais ter jogo, certo? E saboreias mais a companhia de alguém quando sabes a data da sua partida, não é?; e aprecias mais estar num lugar maravilhoso quando só podes lá estar por pouco tempo, não é?; e dá-te mais adrenalina fazer aquilo que não é permitido, não é?
Pois bem, se te lembrares que a morte é algo presente em cada segundo do teu batimento cardíaco; se a olhares olhos nos olhos, sem asco nem eufemismo; se sentires, agora mesmo, que nesta vida és um corpo tão invencível quanto frágil (és um corpo, só um corpo; por mais alma que tenhas, és um corpo) - vais agarrar a vida pelos cornos e agradecer, em cada respiração, a dádiva e o milagre que é viver. E, ao agradecer, estarás já, de repente, sem querer, a ser feliz.


26.04.2012


(Não consegui continuar com o resto dos ingredientes porque já estava cheia de sono. Espero que assim que já fique uma felicidade comestível.)

quarta-feira, 14 de março de 2012

Não vem ninguém fazer-te feliz

Se estás à espera de encontrar alguém que te vai fazer feliz: esquece.
Se achas que vais começar a ser feliz a partir do momento em que encontrares "a pessoa certa" e que tudo vai passar a fazer sentido a partir daí: tira o cavalinho da chuva - esquece.
Se pensas que "o amor da tua vida", que anda escondido algures por aí, um dia vai lançar pozinhos mágicos no teu ser e que, de repente, só pelo facto de se terem encontrado, vão despertar o melhor que há em cada um de vós e, desde esse primeiro dia até ficarem velhinhos, a tua vida vai ser como um "Sonho de uma Noite de Verão" de Shakespeare: estás seriamente a precisar de uma arrumação cerebral ao teu sótão - esquece.

Isso que tu às vezes sentes que te faz sentir a flutuar: essa euforia que te possui num relâmpago histérico, essa serenidade sorridente que te acompanha nos dias frios de tédio - isso que se pode compactar na palavra-cliché "felicidade" - é algo que tu emites com a tua própria luz, fruto de um farol que tu próprio construiste, tijolo por tijolo, enquanto tentavas afastar as ondas que rebentavam ameaçando a tua construção e que, mesmo assim, edificaste o mais para adentro possível no mar da tua vida. Se a luz é tua e o farol é teu, tu é que o acendes ou apagas a teu bel -prazer - tu é que tens a obrigação auto-comprometida de acender a luz do teu farol, ouviste? Essa luz é que irá trazer a ti tudo o que necessitas para continuares a brilhar - para continuares a emitir felicidade. A felicidade é o ponto de partida para tudo o que precisas para ser feliz - percebeste?

Se não percebeste, vou explicar com pauzinhos: a felicidade é o pauzinho I e o que precisas para ser feliz é o pauzinho II. Se ainda não percebeste, vou explicar com ovos e pintainhos: a felicidade é ovo e o pintainho que sai do ovo são todas as coisas que precisas para ser feliz. (Se não te decidires a ser feliz, o teu ovo não vai conceber pintainho nenhum - vai para a prateleira dos ovos infelizes tipo 3 que é a classe de ovos de galinhas desbicadas criadas em gaiolas que só dão ovos tristes que vão ser comidos por pessoas ainda mais tristes. Resumindo: se não te decidires a ser feliz, vais ser comido pela vida, em vez de a comeres a ela.) 

Assim sendo, uma vez mais te digo (para te ajudar a decorar) que não vem aí nada nem ninguém fazer-te feliz. A felicidade não vem de fora - de uma pessoa, de um lugar ou de um acontecimento (estes podem sim despertar em ti a felicidade, se ela já existir escondida dentro de ti) -, vem de dentro (e tu bem o sabes, mas às vezes não queres admitir). 

Então, quando um dia encontrares essa pessoa (essa que pensas que vem fazer-te feliz mas não vem) lembra-te que a única coisa que podes fazer é partilhar a tua felicidade - e da partilha da felicidade surge a sua multiplicação. Mas não podes multiplicar algo que não tens à partida (precisas do 1 para obter o 100; não podes obter o 100 a partir do 0: 10x10=100, mas 0x10=0) - pois se até Jesus precisou de um peixe para o multiplicar por muitos (e tu não és mais que Jesus).

Ouvi dizer que se não meteres isto na cabeça - e no coração e na pele e na caixa toráxica e em todas as artérias de vida que há em ti - vais ser aniquilado pela brutalidade da selecção natural das espécies (que preserva os espécimes mais fortes e deixa morrer os mais fracos, impedindo-lhes de transmitirem o seu código genético de qualidade inferior) - mas podem ser só rumores, não ligues. De qualquer modo, fica aqui o aviso. Se um dia morreres a pensar que não foste feliz por isto ou por aquilo, quando os vermes corroerem as tuas 21 gramas de alma carregada de espasmos não libertados, ao menos não digas que não te avisei.

11.03.2012
17:30


terça-feira, 13 de março de 2012

Felicidade: o responsável és tu

transcrito de um antigo diário escrito em 26.12.2002.

Às vezes sinto que estou no meio do deserto, sem nada a que me agarrar. Vejo a água à minha frente, mas acho que ocuparia melhor lugar entre as nuvens invisíveis do que dentro de mim: sinto-me a evaporar, como se me desintegrasse de tudo o que me rodeia (ou o quisesse fazer) - daí a pouquinho pairaria lá em cima, olhando para baixo: a realidade esfumada, onde eu não queria estar. E, no entanto, sabia que bastava um pequeno gesto para que o sol não parecesse abrasador e infernal, mas resplandecente de vida universal.
A vontade da nossa mente tudo pode controlar: e era essa força que nesse momento me faltava - nem eu achava ímpeto para a recuperar. Parecia que não valia a pena e afundava-me cada vez mais nas areias quentes daquele mar de nada (ou era isso que me fazia sentir o vazio que encontrava em mim).

É assim que se compreende o poder da felicidade. Sem ela perdemos o controlo sobre a vida. Com ela sentimos que podemos conquistar o mundo.
É o sentimento mais poderoso e valioso que podemos experimentar, mesmo quando é conscientemente imperceptível. A sua ausência faz-nos sentir como se toda a beleza do próprio ser ser esvaísse, o entuasismo se evaporasse com a água do deserto, a alegria se tornasse um espectro esquecido, o prazer pela arte e ciência fosse virgindade desconhecida e todo o encanto que o mundo sugere se transformasse de repente numa fórmula desconexa e incompreensível de apreender.
É a força que orienta o nosso rumo quando o vento nos quer derrubar e é a chama que aquece e ilumina o coração e o faz sorrir mesmo perante adversidades. Sem ela, qualquer obstáculo que se apresente - que com ela seria visto como um desafio aliciante - é encarado com uma sensação de auto-comiseração - o que é, no mínimo, intimamente humilhante, não é? É.

É tão bom acordar com um sorriso nos lábios, mesmo antes de saber se lá fora hoje está sol. E se estiver, tanto melhor; se não, não culpemos a falta de sol pela nossa infelicidade.
Cabe a cada qual ocupar-se de manter o seu sol aceso, bem luminoso, dentro da alma quente de cada um - com aquela luz branca que nem o deus sol consegue imitar.
Então, não responsabilizemos os outros ou as circunstâncias que nos rodeiam pela nossa falta de coragem para beber as gotas de água que nos trariam conforto se quisessemos ver a felicidade que nos espera, generosa, do outro lado do oásis da nossa escolha.



domingo, 11 de março de 2012

A paz devia ser obrigatória

A paz devia ser obrigatória. Os países que estivessem em guerra com outros seriam embargados economicamente pelo resto do mundo. E seriam aplicadas coimas por contra-ordenação grave de ameça ao bem-estar mundial, por cada pessoa que fosse assassinada pelo arsenal bélico do país atacante.

Porque é que é crime quando uma pessoa mata e não é crime - é glória - quando é um Estado que mata?

Há uma dose tão grande de infantilidade na diplomacia mundial, que, para lhe compreender a lógica, tenho que imaginar que tenho seis anos e estou a brincar aos polícias e ladrões com o meu irmão.

Vou mudar de mundo.

Até já.







"The only way to deal with an unfree world is to become so absolutely free that you very existence is an act of rebellion" - Albert Camus.



11.03.2012
18:30