sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Fórmula de Deus (carta aberta a Fernando Savater)

Caro Fernando Savater:

Ainda vou nas primeiras páginas do seu livro e não me contenho em lhe escrever. Sei que seria mais sensato ler o livro até ao fim para depois aludir metodicamente a cada um dos seus argumentos e combatê-los um a um, não deixando assim nenhuma ponta de fora que possa ser utilizada contra a minha própria contra-argumentação. No entanto, o meu pequeno resquício de faceta sanguínea ergue-se involuntariamente de dentro de mim ao ler o que tão admirável e letrado cérebro literário espalha com vigor aparentemente racional nas páginas do seu livro anti-vida eterna intitulado precisamente "Vida Eterna".
Ora, como será possível - argumenta o meu estimado escritor - que mesmo actualmente, numa época de tal avanço tecnológico, ainda cerca de 40 por cento dos cientistas acreditarem em Deus - o que é, de resto, a mesma percentagem que há séculos atrás? Como será possível - pergunto-lhe eu - as pessoas andarem tão ceguinhas para acreditarem em algo tão irracional, mesmo não estando nós mais mergulhados na idade das trevas em que a religião era utilizada como ferramenta de concertação social das massas?

Ora, meu caro e admirado escritor, deixe que lhe diga - olhando de baixo para cima, da base da minha humilde posição de leitora não especializada - que a oposição argumentativa Deus versus Ciência (tão popular e - perdoe-me - tão óbvia, tão fácil de construir) não é mais que uma falácia - sim: uma falácia.

(No meu caderno de notas eu tinha isto esquematizado em desenho - forma bem mais fácil de lhe explicar - mas vou tentar traduzir em palavras):

No momento presente, Deus (que, segundo o seu raciocínio, joga na equipa A): é o inexplicável; Ciência (que, segundo o seu raciocínio, joga na equipa B): é o explicável - certo? - até aqui penso que concordamos.
Cada um deles tem as suas limitações: as limitações de Deus são o facto de não ser explicável ou provável porque não temos (ainda) essa capacidade; as limitações da Ciência é o espaço/tempo em que nos encontramos (não conseguimos saber mais do que se sabe até ao momento presente, no contexto em que vivemos), a inteligência (que, mesmo nos Q.I. mais elevados, tem um limite), e a percepção sensorial (não conseguimos absorver mais sensorialmente do que aquilo que os nossos sentidos nos permitem).
Esta é a situação no momento presente.
No futuro, meu caro Fernando Savater, poderemos colocar a hipótese de a própria Ciência ser capaz de de explicar Deus - de o converter numa fórmula matemática. Podemos imaginar até (pois se até o génio Einstein defendia a imaginação face à inteligência, como veículo de criatividade científica construtora de conhecimento - e não apenas seguidora de conhecimento) que, no momento em que a Ciência for capaz de explicar Deus, esta terá atingido o seu último patamar.

Até lá, temos simplesmente que aceitar que Deus é inexplicável.

Posto isto, existem duas opções à escolha de cada um de nós - incluindo à sua (e agora, permita-me tratá-lo na segunda pessoa, não por atrevimento, mas por preguiça em manter o meu estilo directo de escrita):

1. Aceitas que na tua humilde condição humana tens limitações (no momento presente, é certo - no futuro podemos ser vir a ser ilimitados), vestes o "eu só sei que nada sei" de Sócrates (o original, não o corrompido) e decides - mesmo sem provas suficientes - acreditar naquilo que a tua intuição "sabe" que existe (e a intuição não é mais do que o produto de um pensamento instantâneo que ocorre no subconsciente e cuja resposta te surge a nível consciente, dando-te o resultado de uma pergunta mas não te deixando ver o caminho pelo qual chegaste à resposta) - a isto também de chama "fé";
2. Decides que o homem é todo poderoso: que tudo o que o homem consegue explicar existe e tudo o que o homem não consegue explicar não existe.
Esta segunda atitude faz-me lembrar - e desculpando-me antecipadamente pela tosca e nada fundamentada comparação - a mesma que levou a que a Giornado Bruno fosse morto por alegadamente defender que a Terra gira à volta do Sol (o helicentrismo de Copérnico): como os sábios da altura não conseguiam explicar tal teoria, rejeitavam à priori essa verdade, pois violava a sua percepção sensorial e os meios de prova de que dispunham. Só passado muito tempo, quando se conseguiu comprovar e estabelecer na comunidade científica que a Terra gira mesmo à volta do Sol (e não o contrário, como se pensava até então) é que se conseguiu quebrar essa heresia - até que hoje toda a gente sabe que a Terra gira à volta do Sol, apesar de para nós não parecer, pois somos demasiado pequeninos para termos a visão global daquilo que realmente é.

Resumindo, se decidires que, como não consegues explicar Deus, Deus não existe - estás no teu direito. Mas não estás no direito de dizer que Deus não existe - apenas podes dizer que decidiste não acreditar em Deus, porque ele ainda não é explicável - porque não te esqueças que, assim como a Ciência ainda não pode comprovar que Deus existe, a Ciência também ainda não tem meio de comprovar que Deus não-existe. Isto por si só é a prova de que ainda não chegamos ao tempo em que a Ciência será capaz de explicar Deus: com uma fórmula completa nos provará por A mais B que Deus existe (ou não existe).

Compreenda então, meu caro Fernando Savater, como pessoa racional e imparcial que é, que grande parte dos nossos estimados cientistas, optaram pela opção 1: pois é a opção 1 - a de se sentirem pequenos no universo, ignorantes face ao infinito e ávidos por mais conhecimento - que torna o cientista na mente simultaneamente humilde e poderosa que é.


sarrabiscado a 21.02.2012 - 4:30



"A coisa mais bela que o homem pode experimentar é o mistério. É essa emoção fundamental que está na raíz de toda ciência e toda arte."

“A religião do futuro será cósmica e transcederá um deus pessoal, evitando os dogmas e a Teologia.”

“Sem a convicção de uma harmonia íntima do Universo, não poderia haver ciência.”

“Você não pode provar uma definição. O que você pode fazer é mostrar que ela faz sentido.”

“A ciência sem a religião é paralítica - a religião sem a ciência é cega.”

“A mente avança até o ponto onde pode chegar; mas depois passa para uma dimensão superior, sem saber como lá chegou. Todas as grandes descobertas realizaram esse salto.”

“Penso 99 vezes e nada descubro; deixo de pensar, mergulho em profundo silêncio: e eis que a verdade se me revela.”

“Deus é a Lei e o legislador do Universo.”


Frases de Albert Einstein






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